terça-feira, maio 13, 2008

João Qualquer

Seu nome era João. A mãe sempre lhe falou que a sua maior decepção seria ter um filho João Ninguém. A fim de não decepcionar sua querida progenitora, João dedicou grande parte de sua existência à meta de ser João Alguém. No mínimo, João Qualquer, que não fosse Ninguém.
João Qualquer era, contudo, um cara tranquilo. Nunca arrumava briga, pois não sabia lutar. Ofender, ele até sabia.. sabia tocar nas feridas, tirar as pessoas do sério. Mas sempre voltava atrás quando sentia que a disputa poderia cair em danos físicos ou morais acima dos que ele suportaria.
Qualquer estudou até onde foi necessário para arrumar um emprego mediano. Não, o esforço para ele era burrice quando transcendia o estritamente necessário. Coragem para ele também era burrice, em qualquer circunstância. Ser rico demandaria as duas coisas, portanto, como ele não era burro, não seria rico.
Não tinha amigo. No máximo, pessoas mais próximas das quais ele tirava vantagens de vez em quando. Era muito dificil fazer Qualquer de bobo. Ele, todavia, sabia ser carinhoso e solícito o bastante pra enganar a quem fosse útil.
Qualquer um dia se apaixonou de verdade. E ai ele resolveu casar. Durou 3 anos. Quando ela quis ter um filho, Qualquer achou que já seria responsabilidade demais. Entre ter um filho e descasar, descasou-se.
Qualquer mentia a idade. Ele achava que dizer ser mais novo valorizava um pouco sua posição mediana.
De vez em quando, Qualquer bebia. Quando bebia, ele gostava de se sentir atraente. Qualquer gastava 35% de seu salário com prostitutas. As vezes ele não consumava o ato: pedia apenas para a referida profissional do sexo o assediar, para que ele pudesse recusá-la.
Qualquer não era feliz. Mas ele não se importava, pois sabia que quem é feliz quase sempre só o percebe depois que a felicidade se esvai.
Qualquer morreu de tédio. Ou de câncer. Ninguém quis ter certeza...