quinta-feira, setembro 09, 2010

Meu Mundo

O plano era só postar um texto qualquer. O pior texto que fosse. Antônio me escreveu pedindo o divórcio e exigindo que salvássemos o blog em um esforço conjunto. Eu poderia só publicar qualquer coisa antiga, mas me sinto no dever de me justificar. Se eu disser que tenho trabalhado demais, ninguém vai acreditar. Trabalho nunca me impediu de escrever. Eu posso passar o dia editando contratos enquanto organizo frases na minha cabeça. Não, não foi meu chefe quem quase assassinou o blog. Antônio me disse que não tem escrito nada porque eu não tenho cobrado, mas eu sinceramente desconfio que o problema dele seja o mesmo que o meu: amor.

Nesse último post (abaixo) Antônio fala de amor. Mas o que vocês não sabem é que aquele é um texto velho. Porque, em geral, nós dois só falamos de amor quando estamos sentindo falta dele. Quando você tem amor de verdade em suas mãos, você não se preocupa com o que o resto do mundo pensa. Dizer o que você sente não faz a menor diferença se não for para a pessoa que você ama. O resto é o resto. Não importa se a Dilma vai ser eleita, se o seu chefe é um babaca, se o gato roeu o carregador do laptop e por isso você está escrevendo à mão às duas da manhã para não acordar o resto da casa. Tudo o que importa é que, quando você deita a cabeça no peito de quem você ama, o coração dele bate tranqüilo. Esse é o sinal de que o mundo continua girando, e girando em torno desse coração. Se ele está inquieto, você fica inquieto. Se ele está eufórico, você fica eufórico. E o oposto é verdade. Vocês se tornam espelho um para o outro.

Obviamente que já deu para entender o motivo de eu não ter escrito nada nos últimos três meses. Eu simplesmente tenho andado ocupada demais flutuando por aí, admirando os passarinhos. Escrever se tornou supérfluo. Escrever começou a parecer a coisa mais egoísta do mundo desde que essa vontade de dividir todos os momentos com a pessoa amada tomou conta de mim. Você senta sozinho com os seus pensamentos e não cabe mais ninguém ali, no máximo a imagem do outro, mas ainda assim, só uma imagem.

Então, porque eu sei que a vida não é só amor e passarinhos e que é preciso alimentar o corpo e a alma de outras formas, e porque Antônio me deu um ultimato, aqui estou eu falando sobre a minha vontade de passear na praia de mãos dadas. É claro que parte dessa teoria vai por água abaixo se o motivo de Antônio for só excesso de trabalho. Mas e daí? Meu mundo continua girando, não importam os motivos do meu marido bloguístico. Meu mundo, neste momento, dorme e respira tranquilamente.

sexta-feira, setembro 03, 2010

Eu, um monstro

Outro dia eu estava sem ter muito que fazer aqui no trabalho e resolvi dar uma circulada por esses blogs de humor. Eles não acrescentam muito a sua bagagem cultural, mas quase sempre arrancam risos necessários. Deparei-me com um texto simples, bonito e que mudou a minha vida.
Como pude ignorar esse fato por tanto tempo? Lembro como se fosse hoje. Eu devia ter uns doze ou treze anos. Ela não era a primeira, longe disso, provavelmente a terceira ou quarta menina que eu havia decidido amar por toda a vida, do alto de minha pré-adolescência. Era a coisa mais linda que eu já tinha visto: um sorriso largo e tranqüilo, cabelos claros na altura do pescoço, um corpo pequeno, mas já de mulher. Carregava o cheiro da tintura para cabelo que a deixava ruiva, misturando-se ao perfume. É um cheiro que eu jamais vou esquecer. De todo o conjunto de memórias que tenho sobre ela, o cheiro é a mais contundente. Um cheiro forte de uma tintura de péssima qualidade, mas que me traz as mais doces lembranças do início de um amor inesquecível. Lembro, com riqueza de detalhes, de um beijo longo, demorado, próximo ao meu prédio, voltando da escola. Chovia. Tentamos correr para procurar abrigo, mas desistimos. Paramos, nos olhamos com expressões que dispensavam palavras e, por longos três minutos, nos beijamos sem pressa, como se todo o resto do mundo não existisse. Eu sentia o amor pulsando nas artérias e tinha a certeza absoluta que não precisaria de mais nada para ser feliz.

Doce Ilusão.

A parte bonita da história termina aqui. Se você clicou no link e leu o texto que motivou este atual, entenderá que minha experiência apenas corrobora o que nosso amigo descreveu lá.  Essa doce criatura dedicou os dias que se seguiram a essa bela cena romântica ao objetivo sórdido de triturar meu coração e jogar os pedacinhos encharcados de sangue para os cães vira-latas das ruas de Salvador. Me dispensou como quem troca de roupa, mantendo o mesmo sorriso radiante e dando os mesmos beijos sem pressa em outros caras. Vários caras. Quase todos os caras do colégio. E muitas vezes, em minha frente.
Não é muito legal recordar essas coisas, muito menos dividi-las com pessoas que não tem muito a fazer e estão lendo esse blog. Mas é necessário. As pessoas, essencialmente as mulheres, precisam entender que esse tipo de atitude cria monstros. Eu nunca mais, repito, nunca mais fui um bobo apaixonado que beija sem pressa debaixo da chuva achando que aquele corpo vai ficar grudado ao meu para sempre. Passei a me preocupar com a chuva, a preservar meu coração e, mais importante, perdi parcialmente o respeito pelo sentimento alheio.
A culpa não é minha. É como se o encanto tivesse sido desfeito. Não se pode mais seguir numa relação sem entender que aquilo é um meio de se tirar alguma vantagem, como tiraram de mim outrora. Nos relacionamentos seguintes, poucas vezes fui totalmente sincero. Quase nunca confiei plenamente e, quando não estava preso ao compromisso formal acordado entre as partes, quase sempre fui um canalha mentiroso. Isso porque o trauma inicial me forçou a reagir, e essa reação não pode se dar de outra forma que não seja a que leva a canalhice, a cachorrada incontrolável e a infidelidade patológica. Eu passei por tudo isso. Hoje, coleciono histórias nas quais fui o canalha. Outras tantas onde fui injustiçado pela fama de canalha. E ainda algumas outras em que na verdade eu fui o sacaneado, mas dessas quase ninguém sabe. Entendam, mulheres: todo homem foi, é, ou será um canalha. Isso não é lá uma grande novidade para vocês, mas o fato de que a culpa disso é, em praticamente todos os casos, de uma mulher que destruiu o coração do rapaz, ah, disso vocês não se dão conta. O pior é que essa fase é inevitável e o tempo que se leva para sair dela varia muito. Alguns levam a vida inteira. Eu me orgulho de ter sido um canalha muito discreto e gentil, e por essa fase ter durado um tempo relativamente curto.
A coisa funciona como um lacre violado. Não há formas seguras de se reparar. É impossível acreditar novamente no amor eterno, soberano e indestrutível. Nunca mais se ama da forma pura que se configura antes da primeira grande decepção.
Há que se buscar então outras formas de amar. Eu tive experiências maravilhosas, todas bastante sinceras e, por isso, inesquecíveis. Com o tempo o amor se torna algo muito mais racional, e amar alguém pra vida toda passa a ser uma questão de escolha. O amor precisa ganhar contornos racionais para que o trauma do primeiro amor e a crise do cafajeste sejam superados. O homem precisa se convencer de que tem de ser diferente para ser feliz. E ser diferente de um cafajeste significa conseguir amar, da forma mais próxima possível da primeira, que é inalcançável. Há que ter algo de mágico do outro lado. Vocês precisam ser mágicas, para que a racionalidade do homem o convença a amar. A cair no encanto. Mas não é preciso se preocupar muito com isso, por que simplesmente acontece, no tempo certo. E a grande maioria de vocês, mulheres, é encantadora apenas sendo você mesma. Usem essa magia.
O crucial é que as fêmeas, criadoras desses monstros que habitam a terra e são capazes de mentir, enganar e ludibriar a qualquer ser do sexo feminino, tenham cuidado com os julgamentos. Parem e pensem: quantos monstros desses vocês já criaram? Avalie sua responsabilidade, tenham fé, paciência, acreditem no amor que se escolhe, e lutem por ele. Salvem essa alma. Valerá a pena. No final, apesar de toda dor que ele causa, é de mais do tal do amor que esse mundo precisa. Amemos.