domingo, agosto 27, 2006

Psirico's Way of Life

Era uma quarta-feira. Manhã quente, ônibus cheio. Em minha cabeça passavam milhões de fragmentos de idéias, desde minhas obrigações diárias à questões da geopolitica global. Tudo junto, num arranjo que não pode ser expressado verbalmente. Estava eu a analisar a pouca segurança que me oferecia o disputado lugar frente a porta de embarque no ônibus, naquele reduto reservado aos famigerados "traseiristas", quando a cena surgiu e eu pude contemplá-la.
Era um ponto de ônibus. As pessoas entediadas como sempre. Os vendedores nos seus lugares, talvez menos animados devido aos poucos minutos de sol vividos, já que era bem cedo. O peculiar da cena estava a uma simples virada de cabeça de distância dos meus olhos embaçados: lá estava ele, o pregador-mala-sem-alça da vez.
Sim, é desses caras mesmo que estou falando. Daqueles que soltam berros apaixonados alertando sobre a urgência de entregar nossas vidas ao senhor Jesus. Não vou discutir aqui doutrina religiosa. Isso definitivamente não está em pauta. Trazendo o fenômeno pro plano da racionalidade, é discutível a idéia de que é possível se fazer ouvir quando os gritos causam um incômodo tão grande que fecham os ouvidos de quem os ouve para os sentidos das palavras expressadas. Enfim... Mas isso não tem nada de novo. A novidade é que o "Psirico's way of life" chegou e se encaixou definitivamente nas vidas dos nosso pregradores: O senhor de paletó segurava, tranquilamente, um megafone que exponenciava seus gritos, os quais já estavam longe de serem impotentes. "Mas será o impossível?" balbuciou meu companheiro de traseira. "Agora esses miserave levam umas bifa!", o outro, mais acima, respondeu.
Fiquei pensando. É alarmante como o radicalismo religioso, de qualquer espécie, tende a desrespeitar categoricamente as mínimas regras de convivência social. Os evangélicos têm como principal tarefa pregar seu evangelho por todos os quatro cantos do mundo, ok. Mas precisam invadir com tamanha violência o silêncio matinal daqueles que terão um dia duro no trabalho, faculdades, etc.? Possivelmente, ninguém seja salvo nessas investidas. Talvez o objetivo não seja esse mesmo. Talvez seja tudo uma grande encenação, pra vê se Deus reconhece e salva o dito cujo. Aqui entre nós, não seria no mínimo pouco inteligente querer enganar logo Deus?
E depois queremos demonizar os mulçumanos pelo terrorismo. Nos esquecemos que lá a causa é também doutrinária, e igualmente legítima: a manutenção da fé através do seguimento irrestrito da doutrina do Al Corão. Seguir a doutrina justifica os métodos empregados? Deveríamos cuidar do nosso próprio quintal, antes de dizer que a varanda do vizinho fede a cocô, né não? Mas ai tive que concluir o pensamento. Já estava na porta da sala, abrindo-a para entrar num outro universo. Deixei a resolução dos problemas do mundo pra outra hora...

terça-feira, agosto 22, 2006

Perderam a chance de ficar calado/a....

O Papa confidenciou a uma multidão de 600 mil pessoas (...)
No Jornal Nacional, da TV Globo, em abril de 2006

Veja a seguir: livre da prisão, Gil Rugai está solto (...)
No Jornal da Globo, em abril de 2006

Estudar é bobagem.
[João Uchôa Cavalcanti Netto, empresário, dono da faculdade Estácio de Sá. 2001]

Não gostaria que minha filha namorasse um negro. Não quero ter de passar henê no cabelo do meu neto.
[Cláudia Lúcia, dona de casa que participou do programa 'No Limite'. 2001]

"Não paro de crescer como cantora e compositora". [Tiazinha, sobre a própria 'carreira'. 2001]

"Não precisa ter dez cherokees, nem dez casas, uma só basta, não precisa ter toda esta luxúria".
[Núbia Olive, confundindo pecados capitais na 'Casa dos Artistas'. 2001]

"Não sou 'projetada': a coxa é minha, o abdome também. Até o peito é meu. Eu comprei ele". [Joana Prado, a Feiticeira, setembro de 2000]

"O governo devia melhorar as condições humanas do ser humano". [Alice Tamborindeguy, deputada estadual (RJ) enfática]

"O pessimista é aquele que quer te desencorajar porque ele também não tem coragem. Então, ao invés de adquirir coragem ele quer que você adquira covardia". [Olavo de Carvalho, em auto-referência]

"Político não pode ter a mesma freqüência sexual de uma pessoa normal. Temos de viver política 24 horas por dia".
[César Maia, em palestra para membros do PTB (1999)]


E essas, caros leitores, são as minhas preferidas. Com vocês, George W. Bush:

Os países em desenvolvimento com imensas dívidas externas devem pagá-las com terra, com riquezas. Que vendam suas selvas tropicais.
George W. Bush, candidato à presidência dos Estados Unidos, em debate com Al Gore, Washington, 2000

Existe uma ligação entre a Al Caeda e Saddam Hussein. Vocês sabem por que? Porque eu estou dizendo para vocês.
George W. Bush, após a divulgação, em 2004, do resultado da Comissão Federal que investiga os atentados do 11 de Setembro, comprovando-se que não havia nenhuma ligação entre a Al Caeda e Saddam

É incrível que eu tenha vencido. Concorria contra a paz, prosperidade e boa administração!
George W. Bush, 14 de junho de 2001, em conversa com o primeiro-ministro da Suécia, Goran Perrson, sem saber que uma câmera de TV continuava gravando, ao vivo. Relato de Michael Moore no livro 'Stupid White Men', primeira página.


Essas são só algumas. Para mais boas risadas, acessem: www.consciencia.net. Aliás, a ele dou os créditos dessa singela postagem.

sábado, agosto 12, 2006

Mais Gregório, porque faz bem!

Observando a passagem de Regina Casé por nossa bela cidade, pude perceber reações as mais estranhas. É incrível que grande parte das pessoas que me cercam tenham ficado horrorizadas com o quadro de nossa terra pintado (de forma estranhamente interessante, vindo da Globo...) pelo programa "Central da Periferia". Interessante notar que a pequena burguesia baiana se sente "prejudicada" ao ver suas "vergonhas" exibidas, e em rede nacional. As "barbaridades" que nos ficam escondidas, por detrás dos morros, na cidade baixa - em quase todos os sentidos - não podem servir para ilustrar a nossa Bahia. Trata-se de deixar claro, para todo o país: "A Bahia não é isso não,pô!".
Esse retrato pode ser ampliado, e esse comportamento mediocremente burguês visto como inerente à toda burguesia nacional,esta que vive com os olhos voltados para o norte. Nossa elite está sempre exaltando o que vem de fora. Sempre achando belo, bem feito, civilizado, o que está lá fora. Desta forma reproduzem o velho lema que data da época da colonização, uma típica herança ibérica: suga-se tudo que tem aqui, e assim aproveita-se uma vida digna num país já pronto, oras.Dá muito menos trabalho que consertar e arrumar este país aqui. Gregório de Matos não me deixa mentir. Aqui estão seus versos que, apesar de antigos, continuam bastante pertinentes:


Senhora Dona Bahia
nobre e opulenta cidade,
madrasta dos Naturais,
e dos Estrageiros madre.
Dizei-me por vida vossa,
em que fundais o ditame
de exaltar os que aí vêm,
e abater os que ali nascem?
SE o fazeis pelo interesse,
de que os estranhos vos gabem,
isso os Paisanos fariam
com duplicadas vantagens.
E suposto que os louvores
em boca própria não cabem,
se tem força esta sentença,
mor força terá a verdade.



E assim vamos indo, achando absurda a musicalidade da Liberdade... Triste quadro.

terça-feira, agosto 08, 2006

Só se vê na Bahia?

As eleições se aproximam. Nos vemos, mais uma vez, em frente a um mar de absurdos: candidatos, coligações, propostas, noticias, funcionamento do congresso. Todos absurdos, de fato, mas que já nos parecem incrivelmente comuns. Sim, comuns! Que de nós fica espantado com um novo escândalo no congresso? quem se preocupa com o fato do principal rival do obscuro governo Lula ser um católico radical ligado à Opus Dei, e que mantém um discurso que beira o facismo no que tange à luta contra a violência, por exemplo? Pois é, a inércia e o ostracismo são as respostas mais confortáveis que os cidadãos do século XXI puderam encontrar. O não-espanto, a não-revolta, frente à uma conjuntura política que, logicamente, deveria levar a um comportamento oposto. Há ainda quem critique a campanha da MTV, a favor do voto nulo... Entendo que é mais válido defender alguma coisa - ainda que seja o discutível voto nulo - do que não defender absolutamente nada.
Enfim, dentro do contexto do não-espanto, me debrucei sobre um vídeo que tem rolado na net, onde a "baianidade encarnada", o famigerado ACM, defende, sem nenhuma sombra de vergonha, que as forças armadas "atuem" e defendam a "soberia nacional". É uma coisa tão descarada que deve fazer os sobreviventes da nossa ditadura sentirem novamente aqueles calafrios ao lebrarem da tortura...Como é possível que esse tipo de discurso ainda sobreviva no nosso país? O que faz com que um ator político toque num assunto aparentemente "inapropriado" e saia ileso, sem nem ao menos uma puxãozinho de orelha? Aqui na Bahia, onde ele construiu seu império, inclusive dominando a imprensa, nada disso tem importância: ACM é o rei, não importa o que ele diga. Se ele falou, é o melhor pra Bahia...Mas essa é apenas uma das causas.
Primeiro, porque aqui nada mais espanta. Uns roubam, outros usam a máquina pública em beneficio pessoal, e outros defendem ditaduras, ué... Aqui vale tudo.
Antes que se caia no lugar (e erro) comum de afimar que " o coronel sempre volta as suas origens", é mister entender que ACM nunca foi coronel. Antes disso, sempre foi um ator politico dos mais competentes, que soube absorver a conjuntura e agir de modo a fazer com que ela lhe favorecesse. Foi assim na ditadura, foi assim no nascimento do Brasil neoliberal.
Mas o que explica o comportamento do nosso ancião, afinal? Talvez seja saudade dos tempos das rédeas curtas. Talvez seja um sintoma de sua desconexão com a atual conjuntura política, indicando que uma aposentadoria está próxima. A mim me parece, sem sombras de dúvidas, que ele falou por que acha que pode falar, que ninguém irá questiona-lo e que ainda poderá angariar algum prestígio frente à setores pouco críticos da burguesia nacional. É triste, mas tudo leva a concluir que, se o que o motivou foi o último motivo, ele está cheio de razão...