sábado, outubro 21, 2006

Sobre a riqueza do pagode e os não-lugares

Ando as voltas com um certo conceito, o qual me foi apresentado por uns amigos ratos. O mais interessante das discussões pós-modernas, ao meu ver, é a possibilidade de enxergar os fenômenos descritos ali na esquina de sua rua, ou na frente de sua tv. Não que as outras teorias sociais não sejam empiricamente observáveis, muito menos que seja o empiricamente observável um critério de avaliação da qualidade de uma dada teoria, mas confesso que tenho me divertido bastante ultimamente tentando ver como categorias pós-modernas são extremamente mais plausíveis para nossa sociedade que as categorias modernas. Enfim, vou encerrar essa parte chata, que é compreensível apenas para aqueles amigos ratos...
O conceito ao qual me referi é o de não-lugar. Ele me incomodou tanto, que acabei usando de fundos indisponíveis(rs) para comprar o livro "Não-Lugares: Introdução a uma antropologia da supermodernidade", de Marc Augé. Bom, vamos à definição do próprio Augé:
"Se um lugar pode se definir como identitário, relacional e histórico,um espaço que não pode se definir nem como identitário, nem como relacional, nem como histórico definirá um não-lugar." Ou, de forma poética:
"Hoje, não é nos locais superpopulosos, onde se cruzam, ignorando-se, milhares de itinerários individuais, que subsiste algo do encanto vago dos terrenos baldios e dos canteiros de obras, das estações e das salas de espera, onde passos se perdem, de todos os lugares de acaso e de encontro, onde se pode sentir de maneira fugidia a possibilidade mantida de aventura, o sentido de que só tem que "deixar acontecer"?"

O não-lugar é aquele onde o individuo supermoderno não precisa entender, conhecer ou relacionar. É o lugar efêmero, onde todos passam ao mesmo tempo,juntos e sozinhos, numa grande maré de individuos solitários. Você não precisa Ser no não lugar. Lá, você será apenas mais um na multidão, um que passa, que consome ou não, e que vai embora, sem interessar a ninguém de onde veio, e para onde vai. Nesse sentido, o não-lugar é, sobretudo, um enorme desafio à análise antropológica. Mas isso é assunto para um novo post. Eu queria dizer que, ontem, estava eu num desses não-lugares: a estação pirajá. Esse é o mais gritante não-lugar por onde tenho passado ultimamente. Lá eu chego, entro na fila, e pego meu ônibus. Poucas vezes olhei para o lado, por lá. Apenas lá me sinto tão só num lugar tão cheio de gente. Mas ontem, algo pertubou a ordem: um grupo de pagodeiros dançavam, cantavam e riam descontraidamente, na fila ao lado.
O curioso é que, num momento em que o não-lugar deixa de o ser para um grupo específico, ele deixa simultaneamente de o ser para todo o resto. Brotaram ali sentimentos de afinidade e repulsa: senhoras evangélicas reuniram na fila, para comentarem umas com as outras que o mundo está realmente acabando; mulheres jovens da fila, cochicaram umas com as outras, analisando os bumbuns dos caras; Outros, como eu, apenas riram da situação. O que se viu foi a criação de um novo ambiente, onde um grupo sentia-se perfeitamente situado num espaço onde poderia colocar para fora suas formas de expressão cultural, e nesse dado instante todo o não-lugar se transformou em algo novo, e portanto, num lugar. Ainda que seja sob a ótica das senhoras evangélicas, aquele lugar ganhou o sentido de não ser o apropriado para aquela manifestação. A partir do momento em que se atribui um sentido ao não-lugar, que não o de servir de passagem de átomos isolados e, mais ainda, quando esse sentido é compartilhado por outros, o não-lugar é significado, e transforma-se num lugar.
De certo, grande parte dessa transformação repentina pode ser atribuida ao fato de estarmos numa sociedade não totalmente pós-moderna, onde resquícios da pessoalidade provinciana permanecerá por um bom tempo. Contudo, creio firmemente que os não-lugares nunca o são completamente...A possibilidade de transformá-los em lugar está ao alcance, ainda que, como nesse caso, a coerção seja nada tácita. Quão menos fria, e menos triste, seria uma sociedade com cada vez menos não-lugares? me pus a pensar... Apesar de questionar profudamente a qualidade das rimas dos caras, e de entender muito pouco do que elas queriam dizer além das piadas sobre sexo, nunca me diverti tanto naquela estação, como ontem...

sexta-feira, outubro 06, 2006

Inocência juvenil...

"Morena, dos olhos puxados
Riqueza de olhar...
Negra cor dos cabelos, um brilho sem par
As pernas cruzadas, linda, a pensar
Em quê? não se sabe,não importa falar
O que é dito é sentido
contramão ao verbalizar
Um sorriso perfeito, surge de lá
O contraste é sublime
O branco dos dentes, o açai dos lábios
Um convite ao beijar
Beijá-la não posso. Eu aqui, ela lá
Contemplá-la, o que resta
faze-lo-ei até cansar..."


Escrito por mim mesmo, há algum tempo. É incrível como somos extremamente bobocas na adolescência. E é uma prova ainda maior de imbecilidade termos saudades daquelas sensações. A morena nunca me deu bola. O sorriso nunca fora pra mim. E eu passava horas fantasiando...Gastando folhas de caderno com poemas infantis e perdendo aulas que provavelmente teriam uma importância muito maior que suspirar pelo monumento de cabelos negros. Mas era ali, sentindo que tinha um mundo a desvendar, que me sentia verdadeiramente vivo. Construi uma justificativa para explicar minha atual e repugnante vontade de sentir isso novamente. Sim, o prazer no sofrimento é completamente humano...

segunda-feira, outubro 02, 2006

O que dizer das eleições?


As eleições na Bahia apresentaram, certamente, a maior surpresa que poderia acontecer, em todo o país. Jacques Wagner, candidato ligado da dita "banda podre" do PT, a galera de Dirceu e Berzoinni, chega ao governo do Estado de forma heróica, derrotando um adversário que já dizia, por volta das cinco da tarde do domingo, que a eleição deveria se decidir no primeiro turno. Ele acertou, sim, mas errou tragicamente o vencedor...
Impérios sempre caem. Dizem que quanto maior o tamanho, maior a queda. Contudo, a dinastia Carlista já apresentava, há algum tempo, sinais de estado terminal: perdeu inúmeras prefeituras no interior do estado; a eleição de Lula diminuiu seu poder de barganha frente ao governo federal; e o mais claro deles, perdeu a prefeitura da capital de forma humilhante. Ainda assim, perder o governo do Estado nessa eleição é uma derrota inédita, devido as circunstâncias, e que pode trazer prejuizos imensuráveis. Primeiro, porque o governo do estado era o último reduto de poder formal do carlismo. Segundo, porque Paulo Souto aparecia como possível sucessor do "cabeça branca", articulando os partidários em sua volta e tentando construir uma força política na base da submissão total dos aliados, nos moldes do seu "mestre". Agora a situação muda, e Paulo Souto terá de mostrar a mesma competência do seu "criador", quando esse se viu sem nenhum poder nas mãos, em meados dos anos 80. Sua volta foi triunfal.. Vejamos o que poderá articular Seu pretenso sucessor.
No cenário nacional, a disputa acirra-se. Lula cometeu um erro fatal em não ir ao debate, e acabou levando a decisão para o segundo turno. Claro está que, apesar de não assitir aos debates, o povo choca-se em saber que Lula faltou. Pode-se dizer que o povo brasileiro não analisa as propostas nem procura saber da história política e orientações ideológicas dos candidatos, mas nunca passará batida a "covardia". O pensamento político do nosso povo é eminentemente moralista.
Vejamos agora que tipo de governo fará Wágner. Esse já está um passo a frente do nosso atual prefeito, quando não construiu uma aliança gigantesca e obviamente inoperante.Terá que torcer para uma vitória do Lula no plano nacional e, sobretudo, para que não caia nenhum novo escândalo sobre a honra de seu partido, e consequentemente, sobre a sua honra.