domingo, abril 04, 2010

Do amor e dos frangos

Começou mais uma vez. Veio do nada, como sempre. Eu estava bem. Tive um bom dia. Afinal, o que é um bom dia? Fez sol, dormi bem. Minha pele, inesperadamente, estava ótima. Meu almoço desceu meio quadrado, mas, fora isso, tudo foi ótimo. Daí bastou alguma coisa não sair bem como eu queria e me tornei uma megera insuportável. Então me senti péssima porque sou uma megera insuportável, sendo que talvez nem tenha sido tão horrível assim.

Recentemente terminei um trabalho que vinha protelando e arrastando pelos últimos dois anos, e fiquei surpresa ao perceber o peso do fardo que eu vinha carregando. É a primeira vez em dois anos que posso dormir mais um pouco, tomar um chopp ou inventar uma viagem de última hora sem pensar que deveria estar fazendo outra coisa, em outro lugar. Isso me encheu de otimismo, afinal, se eu posso vencer minha auto-sabotagem, posso vencer qualquer coisa. Ou quase qualquer coisa. Mas algo ainda está fora do lugar.

De vez em quando entro em curto-circuito e começo a pensar coisas horríveis sobre mim mesma, como hoje. Sobre como não sou boa o bastante para nada nem ninguém. Então fico com vergonha por pensar essas coisas, porque essa falta de auto-estima só pode ser também um defeito. Por isso fico escondendo o que penso a meu respeito para que ninguém saiba que na verdade me acho uma mosquinha. Ou então conto logo que sou um desastre para me poupar de ver a decepção nos olhos dos outros mais tarde.

Eu me sinto péssima por me sentir péssima assim. E eu tive um dia que tinha tudo para ser ótimo: recebi a mensagem mais romântica do mundo, ganhei um bolo de chocolate, aprendi a fazer ovos pochê, dormi até cansar, passei longe de saltos altos e consegui tirar de letra todos os pepinos e abacaxis do trabalho. E ganhei uma mini-bola histórica Adidas na promoção da Copa do Mundo do cartão de crédito! Cara, quando foi a última vez em que ganhei alguma coisa em promoções ou sorteios? Nunca! Quer dizer, eu ganhei um frango assado no bingo da igreja quando tinha quatro anos. Será que isso conta?

Sabe o que eu queria? Que os afetos fossem como os hinos de times de futebol – incondicionais. Só assim poderia ficar tranqüila com o fato de que, apesar de ser mesmo uma criaturazinha insolente e ranzinza, eu sempre teria para onde correr no fim do dia. Alguém que, quando me ouvisse reclamar que não consegui uma promoção, levasse meio segundo para me dizer: ainda. Será que existe alguém assim? Que sempre me dissesse “ainda”, não importa o quão intragável eu me tornasse?

Acho que sou como uma criança abandonada. Preciso que alguém me diga que sou boa o bastante do jeito que eu sou. Era isso que queria ganhar na promoção do cartão de crédito. Seria bom. Em vez de trocar os pontos por milhas a gente trocaria por amor incondicional. Mas não existe isso de amor incondicional. Amor não se compra e nem se ganha em sorteios. E também não funciona como o hino do Grêmio.

O fato é que temos de ser capazes de cuidar dos nossos próprios demônios. Ninguém deveria ter a responsabilidade de fazer o outro feliz – é um fardo pesado demais para qualquer um. Em um mundo ideal, ninguém precisaria de confirmações nem de reforço positivo para viver bem. Todos se achariam bons o bastante – para qualquer um e para qualquer coisa. Ninguém entregaria sua cabeça (ou sua felicidade) em uma bandeja de prata para um outro alguém. Seria um mundo perfeito, não? Não haveria medo. E não sentiríamos falta de alguém que nos protegesse de nós mesmos.

4 comentários:

Minha Vida Real disse...

Cara Fernanda, eu nunca vi (ou li) ninguém sentir-se tão semelhante a mim nesta vida!! (Rsrsrs!)
Belo texto! Parabéns!


Poliana Alves

Unknown disse...

Fenha,minha amada gerente e super (mas quando falo super, é super mesmo) amiga, voce nao é boa do jeito que é. VOCE É OTIMA. por isso eu te amo loucamente

Antonio Rimaci disse...

Ah não! Puxar o saco da chefe no blog é demais! rsrsrsrs

Mas eu tb acho Nanda ótima. Inclusive os lamentos dela. Todos muito bons. ;)

Umeru disse...

caramba!!!!

um soco no estômago!

Exatamente me senti assim hoje. Ser bom...ser ruim...ser bom..ser ruim .... ah. Parei com isso e fui ouvir uma música, lá da Suíça, uma e-music.

Muito bom ver e rever essas palavras. Estranhamente sinto um conforto. Não estamos sozinhos!

parabéns pelo blog. Palavras bem colocadas nos levam para dentro de nós mesmos.

beijos a abraços