segunda-feira, junho 19, 2006

Quando nem o meu Horror é meu só...

Eu odeio hospitais. A explicação para tal sentimento pode tomar vários caminhos. Gosto, particularmente, de dois. Um seria considerar uma inclinação natural: as pessoas vão a um hospital quando não estão bem, logo, o instinto de preservação manda fugir deles, enquanto é possivel. Mas essa explicação é por demais genérica e acaba me remetendo a um sentimento de não-exclusividade em relação aos que me cercam, e isso em uma sociedade capitalista dos "seres individuais", e do "estilo próprio", pode me levar a um suicídio. O outro é mais subjetivo ( e, felizmente, me parece mais "individual"): tenho horror a climas tensos, de qualquer espécie. Não é medo da morte, não mesmo. Isso seria natural demais, também. Eu não suporto o limite entre o sofrimento e o alívio, intríseco a qualquer ambiente de tensão. Prefiro sofrer logo, ou aliviar-me logo. Alguém poderia dizer que a tensão já é uma maneira de sofrer, e que todo mundo sofre com a tensão, mas eu não consigo sofrer enquanto estou tenso, e me apego nesse mínimo detalhe que eu mesmo forjei pra assegurar minha individualidade. Sim, eu sou humano. Mas só naturalmente humano.
Bem, acontece que, dia desses, vindo da faculdade, recebi um chamado de emergência familiar. Não interessa entrar em detalhes. Interessa que tive de ir a um hospital. Classe média, arrumadinho. Até o cheiro característico era bem disfarçado. Enfim, resolvi aproveitar a situação inevitavelmente desagradável e fazer algo de útil. Comecei a observar pessoas que, notadamente, eram frequentadoras assíduas daquele ambiente. Foi ficando engraçado... São pessoas obviamente debilitadas, algumas com a morte a bater na porta. Contudo, o que menos se vê é tristeza, ao menos tristeza exposta. Para além das conjecturas possíveis, achei relevante a familiaridade que aquelas pessoas têm com um ambiente que a mim me parecia tão assustador. Elas passeiam pelos corredores, brincam com os funcionários, comemoram os gols da Copa do Mundo em frente à tv. E aos poucos meu horror foi se transformando em curiosidade, e depois, em conformismo. Pensei cá com os meus botões, " o próximo passo é tranformar esse conformismo em felicidade!". Quis correr. Meu tão peculiar ódio por hospitais estaria indo embora. Depois, passado o susto, ri sozinho lembrando de umas aulas de antropologia. Bastaram algumas horas pra que eu tranformasse aquele ambiente confuso em um conjunto ordenado de idéias e conceitos e, ao perceber que quase ninguém "sofria" ali, o horror que parecia ter raizes naturais - ou apenas individuais -, sumiu. A interação social o fez desaparecer. Quando dei por mim, já estava quase gostando do lugar, das companhias... A conclusão óbvia é que aquele horror outrora citado como só meu, ou apenas um vestígio de instinto de sobrevivência, não poderia desaparecer assim, sendo um ou outro. O horror era cultural, e pautado num preconceito. Portanto, nunca fora só meu!
O ser humano é absurdamente anti-natural. Como pode, algum ser vivo, se divertir num hospital? E, afinal, como pode um terror, o mais evidentemente natural, ser desmascarado, simples assim, como um preconceito socialmente forjado? O temor que quis que fosse exclusivamente meu, é social e culturalmente construído? Definitivamente, antropologia não combina com os tempos de "Malhação", MTV e RBD. Eu quero ser exclusivo. Eu quero ser eu mesmo! Eu quero ser só naturalmente humano! Mas a antropologia não deixa. Ah, que saco! Vou dormir, pra esquecer...

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